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22/08/2021 às 18h01min - Atualizada em 22/08/2021 às 18h01min

Tenho meus conflitos com Araraquara, afirma Teresa Telarolli

Araraquarense revela suas divergências e seu profundo amor pela cidade

Cassiane Chagas

A trajetória de vida de Teresa Telarolli se entrelaça em parte significativa da história de Araraquara. Seu pai, Rodolpho Telarolli, tinha um amor incondicional pela cidade. Defendia fortemente o registo da história local e elevou Araraquara ao conhecimento nacional com suas pesquisas e publicações. Ele escreveu o renomado livro "Britos, República de Sangue", que conta a história da morte dos Britos em Araraquara, no século 19.

 

Era militante da preservação ambiental da cidade, em uma época em que não se debatia o assunto. Não diferente do pai, a cientista social, historiadora e escritora, Teresa Telarolli, chegou a mudar de área profissional e até mesmo de cidade, mas a paixão foi maior. Fruto desse histórico familiar.
 

Não dá para separar, nem quero. Eu tenho orgulho de quem foi meu pai, de quem ele era como pessoa”.

 

Teresa se recorda da mente brilhante e o jeito desassossegado do pai quando se tratava da preservação histórica de Araraquara.

 

Meu pai era um apaixonado pela cidade. Isso foi se manifestando de maneira cada vez mais intensa no decorrer da sua trajetória profissional e pessoal. Ele tinha, junto com a pesquisa, um traço de militante que era muito forte e que se confundia com a questão acadêmica e que fazia dele um exemplar quase que único. Era absurdamente inteligente e movido a paixão. Isso fazia dele um agente de militância que quebrava paradigmas”.

 

Teresa Telarolli ressalta ainda as conquistas realizadas pelo pai, por meio de luta e militância. A preservação de espaços importantes e que permanecem inalterados até hoje, foi por conta do professor.

 

A Rua Voluntários da Pátria, Rua 5, é um caso. Num passado recente ela foi apropriada pela cidade. Só quem ama a Rua entende qual o diferencial, mas nem sempre foi assim”.

 

Ela explica que na década de 1980 foram propostos diversos projetos que pretendiam derrubar as árvores para alargar a Rua.

 

Por meio de uma percepção muito clara, ele decidiu realizar um trabalho para que aquela rua fosse preservada por meio de um decreto. É esse decreto que preserva até hoje, a Rua 5. Isso que garante a sobrevivência dela”.

 

 

Mas isso foi feito há 30, 40 anos. Hoje é o mínimo que se pode esperar, mas não era assim. Foi graças a essa coisa meio visionária que ele tinha, de alguém que está adiante do seu tempo e sozinho. Ele era um lutador solitário, porque as pessoas não tinham uma compreensão da preservação como um valor”, explica.

 

Rodolpho Telarolli morreu em 5 de junho, de 2001, aos 67 anos. Teresa tinha 36 anos na época.

 

 

 



 

Dizer que ele não influenciou na vida da gente? É lógico que influenciou. Você é criado com valores muito bem estruturados, com muita coerência. Você recobre tudo isso com afeto porque é teu pai. Ele era um pai cheio de qualidade e era um pai cheio de defeitos, mas que tinha generosidade. Era um exemplo de coerência, de percepção política, de empatia e de liberdade, o que é raro. A influência do meu pai e da trajetória dele foram muito fortes naquilo que eu sou”

 

Tentou mudar a trajetória, voltou a registrar a história

 

Apesar de um histórico familiar forte, Teresa Telarolli seguiu seu caminho com as próprias ferramentas, embasada nas influências que não absorveu apenas do pai.
 

Sou a caçula de três irmãos e tive a influência muito forte do meu pai, da minha mãe e da minha irmã mais velha, que tem sete anos a mais do que eu”

 

Os irmãos seguiram a vida acadêmica, mas Teresa, até mesmo por ser a mais nova, percorreu caminhos um tanto diferentes.



 

Durante 14 anos eu me formei, dei aulas. Fui cumprindo com aquilo que se era previsível, mas um certo momento eu fui trabalhar na iniciativa privada. Fiz carreira no setor bancário e fiquei por 14 anos. Foi quando eu tinha mais de 30 anos e por uma inquietação minha, não queria continuar onde estava, mesmo que bem financeiramente. Eu percebi que não sabia o que queria fazer, mas sabia o que não queria fazer”.

 

Foi então que ela decidiu voltar para Araraquara. Teresa nunca havia se desligado das pesquisas. “Retornei em 2002, momento em que tinha me dado um ano sabático para ver o que eu queria fazer, mas as coisas começaram a acontecer. Eu comecei a trabalhar novamente com pesquisa. Fui contratada para escrever a história de uma empresa e as coisas foram se desenhando e não parei mais”, explica.

 

Após dois anos, Teresa foi convidada por Edinho Silva, que era prefeito no seu segundo mandato, para instalar a Coordenadoria de Preservação do Patrimônio de Araraquara.

 

Eu trabalhei até 2008, depois continuei na pesquisa, continuei escrevendo. Então fui convidada para assumir a Coordenadoria da Chácara Sapucaia da UNESP. Lá eu fiquei por cerca de 8 anos em um trabalho maravilhoso. Foi quando Edinho me convidou para assumir a Secretaria da Cultura e aqui eu estou já no quinto ano”.

 


 

Araraquara: relação de amor e rejeição

 

Araraquara é para mim como é para todo mundo, na relação que tem com o espaço onde se nasce. É uma referência. Um afeto imenso”.


Porém, Teresa também enfrenta conflitos com a cidade que tem amor profundo. Construiu suas raízes em Araraquara, por cerca de uma década deixou a cidade, mas acabou retornando, ocupando espaços relevantes para a composição histórica do município. Mas como a filha dessa terra a vê? Qual sua relação com a cidade?

 

Araraquara tem para mim uma completude. Lógico que como todas as relações de amor e de afeto profundo, a gente tem conflitos. Tem uma Araraquara que eu amo profundamente, que é essencial. E tem aquela Araraquara que eu rejeito, que é uma cidade que tem um perfil mais conservador, um perfil excludente. Uma Araraquara que separa e que segmenta sua população”.

 

 


 

Uma cidade que faz questão de garantir a invisibilidade daqueles que são menos favorecidos. Uma Araraquara que, de alguma maneira, enaltece os grandes nomes, os grandes sobrenomes, mas que faz questão de esquecer, de apagar aqueles que de fato a fizeram e a fazem. Essa é a minha relação de conflito com a cidade”.

 

Segundo Teresa, esse é um comportamento observado também em outras cidades com as mesmas características de Araraquara.

 

Uma população heterogênea, ainda com um viés conservador, não diferente do que acontece em outras cidades como São Carlos, Bauru, Marília e Rio Claro. São cidades estruturadas muito apegadas a uma determinada elite, que às vezes ela nem existe mais, porém está no imaginário das pessoas. Ao mesmo tempo é uma cidade que tem essa efervescência, esse aspecto de renovação. De uma cidade em pleno desenvolvimento econômico, com um potencial muito grande”.

 

Ela ressalta o seu ponto de vista a partir do que vivencia, mas que não muda o sentimento de amor e a convicção que podem haver mudanças.

 

São como relações de amor, que a gente ama e às vezes não gosta, mas que ao mesmo tempo o amor supera as diferenças”.

 

Evoluir, sem perder a memória

 

Não é de hoje que Teresa Telarolli, assim como o pai já buscava no passado, procurar esclarecer a importância da manutenção de patrimônios históricos tangíveis e intangíveis.

 

Ela acredita que falta disposição das pessoas em discutir o tema, até mesmo por conta de um preconceito incutido.

 

Desde a década de 1970 as pessoas confundem o antigo com o velho. Uma oposição entre desenvolvimento e modernidade com preservação, como se fossem coisas incompatíveis. Ou a gente rompe esse processo com educação patrimonial e com o envolvimento da população ou a gente vai ter uma cidade, com um potencial de desenvolvimento acontecendo, mas pagando o preço da perda da sua história”, ressalta.

 


 

As pessoas ainda têm dificuldades de entender a importância, por exemplo, do Patrimônio Ambiental e a sua preservação. Elas entendem, muitas vezes no amplo, mas elas não entendem qual o papel delas, como podem fazer a diferença. Talvez atualmente isso é o que mais me incomoda”.



As Grandes Paixões de um coração Corintiano

 

Essa é outra paixão que Teresa Telarolli herdou do pai, ambos eram apaixonados pelo time. Mas ela não vive de poucas paixões. Teresa ama Araraquara e confessa que tem um lugar na cidade que desperta um sentimento especial. A Praça da Independência.

 

Gosto de muitos lugares, mas esse espaço é o que eu mais gosto. Tanto que eu tenho um pacto na família de quando eu morrer onde que eu quero que jogue as minhas cinzas, que é naquela Praça. Eu amo ela. Acho que é o lugar mais bonito da cidade, naquela composição com a Rua 5”.

 


 

Eu cresci ali, a dois quarteirões da Praça. Uma infância que era mais livre. Acho a Praça da Independência maravilhosa. Acho que ela merece inclusive um olhar diferente das gestões públicas e da população. É um espaço lindo”.

 


Outras paixões de Teresa

 

Teresa Telarolli tem animais e os adora, são nove no total, quatro cachorros e cinco calopsitas. “Eu sou doida por animais. Tive bichos a vida inteira”.

 

Ela também ama viajar e sua paixão, com um comprometimento maior, é com a área da cultura da cidade, onde é secretária da pasta.

 

Ela explica que assim como infraestrutura, educação, saúde e alimentação, a cultura também necessita chegar em todos os espaços, respeitando sempre a diversidade.

 

Não dá pra gente falar em política pública, seja em que área for, se a gente não tratar das periferias, sobre a perspectiva de estar fora da centralidade, e nem das chamadas minorias políticas. Se você quiser implantar uma política pública honesta, há de se considerar um diálogo e uma permeabilidade frente a todos os segmentos sociais. Se a periferia não pode ir ao centro, as ações devem ser realizadas no espaço da periferia. Isso não deve ser um compromisso e sim uma obrigação. Não cabe mais esse tipo de limitação ou de restrição a qualquer município”, enfatiza.

 


 

Muitas histórias, minha morada: Araraquara.




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