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26/07/2020 às 13h23min - Atualizada em 26/07/2020 às 13h29min

The Terror: série com apuro estético, mas inconstância entre temporadas

Por Guilherme Jorge da Silva

As tripulações das embarcações da marinha britânica HMS Erebus e HMS Terror se aventuram para descobrir a passagem do noroeste. A insistência de Sir John Franklin (Ciarán Hinds) em navegar através do gelo, mesmo diante a inquietação do capitão Francis (Jared Harris), levará todos para um inferno branco.

Baseada em uma expedição real do século vitoriano, mais especificamente no livro ficcional homônimo de Dan Simmons, a primeira temporada da série produzida por Ridley Scott entrega uma obra muito bem produzida, conduzida e atuada. Com ótimo elenco, temos uma jornada pela vastidão fria da mente e do comportamento humano. No gelo do ártico encontraremos ecos de Mary Shelley (Frankenstein) e do ancestral desconhecido de HP Lovecraft como uma grande metáfora do funcionamento da psique humana em exaustão, fadiga e limite da sobrevivência. Igual ao Prometeu moderno, ao descobrir o que não deveria, coloca-se todos os navegantes em um estado letárgico de tensão, com problemas de abastecimento, alimentação, convivência, alcoolismo e paranoia. Essas facetas são exploradas nos dez episódios que, ao parecer extenso demais, impõe a tônica necessária de um túmulo na neve.

Uma criatura complica ainda mais toda a situação. Um terror branco, imenso, que emula um urso, mas que não é um urso. Ligada aos esquimós, reforça o preconceito ao que a mente humana não é capaz de compreender. Em conta gotas, um por um cai diante a besta, reforçando a dualidade homem vs natureza. Os cortes sequenciais silenciosos e a narrativa lenta nos transportam ao fantástico - que não é tão fantástico assim, posto que parte da história de fato aconteceu – com exatidão cirúrgica. Aliás, a qualidade da produção é invejável para um produto televisivo, seja na utilização do CGI ou na construção da atmosfera claustrofóbica de aprisionamento no gelo.

O trabalho em camadas do ser humano também é excelente, ao lidar com os próprios demônios, os demônios da coletividade e o demônio bestial em si. A loucura de O Iluminado (1980) também serve de base para a instabilidade emocional em isolamento – tema, aliás, muito pertinente para os tempos que estamos vivendo.

Já a segunda temporada nos remete aos Estados Unidos da Segunda Guerra Mundial, onde imigrantes japoneses eram tratados como inimigos públicos. Esse contexto serve de plano de fundo para um espírito japonês vingativo entrar em ação, matando sistematicamente. Apesar das inúmeras voltas sem propósito de um roteiro não tão consistente como o da primeira temporada, a trama é corajosa ao retomar uma narrativa evitada pelos americanos: a época em que o país da liberdade aprisionou centenas de japoneses em campos de concentração. 

Não é novidade, em obras nipônicas, a presença de um espirito vingativo poderoso. A resiliência e sua motivação, nesse caso, são incomodas e frágeis. Ainda assim, entrega-se momentos de bom terror e atuações excepcionais de descendentes japoneses – bem como parte da equipe envolvida. A infâmia, dita em discurso pelo Presidente Franklin Delano Roosevelt quando os EUA entraram na II Guerra Mundial, serve como subtítulo de um conto japonês americano que trata com a devida consideração e respeito todos aqueles que foram vítimas do maior embate da civilização humana.

Com uma segunda temporada menor, The Terror ainda entrega um produto rico em detalhes e apuro estético, disponível no catálogo da Amazon Prime.

Foto em destaque: AMC/ Divulgação


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